sábado, 22 de julho de 2017

Criança autista x igrejas






Pra dizer a verdade nunca imaginei que um dia eu faria um post com esse assunto... Criança Autista X Igrejas? Sim, e você ai entender o porque do "X" significando "versus"

Aqui em casa somos cristãos e frequentamos a nossa igreja em torno de 2  a 3 vezes na semana, e frequentamos a mesma igreja desde que o Miguel nasceu. É uma igreja com instrumentos musicais, bateria que é super barulhenta e por sinal o Miguel adora, nunca tivemos problemas com barulho, talvez seja por ele ir desde muito pequeno e com tanta frequência que acabou se acostumando, mas na verdade, pessoas demais e barulhos nunca foram motivos fortes de crises no Miguel, mas já tivemos sim vários outros tipos de problemas a ponto de eu não querer mais voltar na igreja afinal o Miguel não conseguia ficar sentado, queria só ficar correndo o tempo todo e por toda a igreja, sim, era horrível, eu ia na igreja mas não conseguia ouvir nada e as vezes achava que nem as pessoas ao lado também conseguiam, era um verdadeiro terror eu e meu marido ficávamos a maior parte do tempo lá fora com ele, porém nossa igreja é bem pequena e com uma "família" e mesmo antes do diagnostico do Miguel até entendiam um pouco a situação, claro que alguns se mostravam incomodados, mas superamos.



Depois do diagnostico, já sabíamos que ele era hiperativo também e que alguns autistas tem dificuldades em ficar sentado mesmo, então pelo menos tínhamos um porque daquele comportamento, e já sabíamos que não era falta de correção nossa como algumas vezes até nos mesmo pensamos, mas em um dia como eu já contei aqui eu não aguentava mais a situação e o que fiz acabou dando certo, pra quem não leu ainda, em um dia de agitação que ele queria ficar correndo pela igreja, eu o levei lá fora, falei firme e muito brava que aquela situação se acabava ali e ele deveria ficar sentando em nosso colo, talvez eu até tenha sido um pouco dura ou foi isso o que pensei na hora porque achava que ele nem entenderia a bronca, mas funcionou, entramos na igreja e o Miguel ficou no colo do pai o resto do culto. No decorrer do tempo o Miguel começou a tomar risperidona e ai ele acalmou mais ainda e até hoje ele sempre dorme na igreja logo que o culto inicia, até já temos um colchãozinho pra ele por lá pra ele ficar tranquilo, mas o que me levou a escrever esse post foi os muitos relatos de pais que tenho visto contando as situações que passam na igreja e alguns já vieram falar comigo "imbox" porque não conseguem mais ir a igreja ou se sentem constrangida com as pessoas ao redor.




Bom, foi o tempo que pessoas deficientes ficavam dentro de casa, todas tem o direito de sair e frequentar os mesmos lugares que nós e cada vez mais temos vistos pessoas deficientes saindo de casa, o que me deixa muito feliz, mas infelizmente acho que algumas igrejas e até pastores ainda não perceberam bem isso.
"Fiquei muito triste essa semana que li o relato de uma mãe que foi na igreja com o filho e no meio da pregação, o filho autista começou a gritar incomodado com o barulho, o pastor então pediu pra mãe levar o filho na frente para orar por ele e a mãe foi feliz, afinal oração nunca é demais, porém o pastor começou a orar "expulsando" o demônio que fazia aquela criança ficar agitada como se não fosse o autismo e sim "possessão".  Pelo amor de Deus, pastor.... o senhor conhece ou já ouviu falar em autismo, sensibilidade a sons, desordem sensorial ou alguma coisa assim? 

Claro que não posso generalizar, mas foi total falta de sabedoria desse pastor e claro que a mãe voltou super triste e com certeza não voltará nessa igreja, por outro lado o pastor não é obrigado a conhecer o autismo, mas se você não sabe, é melhor ficar quieto 'rsrs. Nem tudo é demônio, existem transtornos, síndromes e doenças também e a igreja precisa estar preparada para receber pessoas deficientes também. Essa é velha mania infeliz de algumas pessoas que acham que tudo é o diabo ou que tudo é castigo, e se temos um filho especial é porque pecamos, parem com isso: meu filho é perfeito demais pra ser um castigo, aliás se ter um filho é um castigo eu vou pecar mais porque o Miguel é um verdadeiro presente em minha vida é tudo de melhor que eu tenho. Parem por favor de julgar só de olhar.



Quer ajudar? 
Que tal oferecer um espaço com brinquedos ou sei lá mais o que para a criança? Meu marido foi visitar uma igreja com o Miguel e eu não fui porque estava trabalhando, ele contou que o Miguel ficou bem agitado, porém as pessoas da igreja no intuito de ajudá-lo, levou o Miguel para o ambiente das crianças, uma escolinha digamos assim com brinquedos e televisão e o Miguel ficou super bem lá. Essa é a diferença que as igrejas podem fazer, eu conheço muitos pais que deixaram de frequentar a igreja por causa dos olhares atravessados das pessoas com a criança especial que não parava quieta, outras que tem que revesar com alguém, um dia um fica em casa com o filho e no outro dia vai a igreja enquanto o outro fica em casa.  Tanto os pais como as pessoas deficientes tem o direito de seguir a religião que acredita e precisamos nós de todas as religiões estar preparados para receber e acolher tais pessoas. Já se foi comprovado que a fé ajuda e muito até mesmo na saúde, então que possamos ter o direito a professar nossa fé, seja igrejas evangélicas, católicas, ou demais templos, precisamos oferecer um local adequado a essas pessoas e um bom acolhimento a família que eu tenho certeza que precisam.



Que tal pensar em tradutores de libras para deficientes auditivos, rampas de acesso para cadeirantes, banheiros adaptados e claro que se possível, um espaço para autistas. 


Muitas crianças autistas não ficam bem com o som alto, dificilmente vão ficar o tempo todo sentada, podem dar uns gritinhos de vez em quando seja de felicidade ou apenas uma estereotipia, pode bater palmas fora da hora, ter uma crise de riso, ou de choro, e nem por isso ela não deveria sair de casa, sejamos compreensivos com a situação, e se não podermos ajudar que não venhamos a falar "abobrinhas" que só vai piorar a situação para a mãe. São diferentes sim, e daí? Só porque não seguem o seu padrão? Igreja tem que ser acolhimento e isso eu  acho que serve pra qualquer religião, que os líderes possam pensar nisso, pregam amor ao próximo, então que se coloque em prática isso, amor, empatia, paciência e qualquer sentimento que situações assim exigem. Que a igreja não fique "X" o deficiente, mas que seja um lugar de acolhimento, assim como a sociedade tenta a verdadeira inclusão, a igreja também faz parte da sociedade e deve procurar se adaptar a situações assim, que essa atitude tenha inicio nos lideres mas nós como membros possamos também fazer a inclusão acontecer. Inclusão é preciso na escola, no parque, no shopping, no supermercado, em casa e claro na igreja também.



domingo, 16 de julho de 2017

Filho, onde está a sua dor?





Era um dia como todos os outros, estávamos na igreja como todos os domingos e o Miguel já estava deitado no colo do meu marido cochilando como sempre faz. De repente ele fica nervoso e começa a ter uma crise de agressividade sem ter uma explicação aparente. Não foi nada a ponto de ter que sair com ele do local com uma crise quase incontrolável, mas não sabíamos o porque dessa crise em um momento em que nunca aconteceu. Ele sempre dorme tranquilamente e mesmo quando não dorme na igreja, o que é raro acontecer, ele fica sentado o colo do pai. 



Ofereci a mamadeira e ele não quis, ofereci uma bala e ele também não quis, alguém pode questionar sobre o barulho do ambiente, mas não isso nunca foi problema para ele, talvez porque sempre fomos com ele para a igreja e ele já cresceu nesse ambiente, nem na igreja e nem em outros locais ele nunca se incomodou com barulho. Depois de um tempo sem saber o que fazer para acalmá-lo eu pedi ao meu marido que o levasse para tomar água, mais no sentido de dar um volta pra ver se ele ficava melhor e foi quando descobrimos o que estava acontecendo, ele estava com muita sede, tomou 3 copos de água e voltou e dormiu tranquilamente...

Miguel não fala, solta algumas silabas mas as poucas palavras que fala, são sempre de maneira funcional como por exemplo "não, vamos, amo"

Essas palavras ele não fala de maneira solta mas quando realmente precisa delas pra expressar o que quer, e mesmo que não fale sempre mas usa de maneiras correta quando a faz. Embora por volta dos 10 meses ele tenha começado a falar várias palavrinhas, depois de um aninho ao invés de aumentar ele diminuiu o vocabulário até não sobrar nada e hoje são meia duzia ou até menos palavras. Eu já fiz um teste sobre o nosso sexto sentido de mãe e sobre como as vezes "adivinhamos" o que eles sentem ou querem, sobre como aprendemos a interpretar aqueles olhinhos brilhantes e aquele gesto que talvez passe despercebido por pessoas que não convivem com nossos pequenos, mas no final do texto eu disse como seria bom se tudo fosse apenas assim, mas disse que havia o lado oposto que também vivemos e sobre isso que hoje eu quero falar. 


No domingo passado eu estava olhando o ouvido do Miguel e notei um odor diferente e uma cera mais escura, fiz a limpeza e como sempre faço enquanto limpava eu ia "conversando" com ele, até perguntei se estava doendo mas claro que ele não respondeu e sempre que eu ia verificar o ouvido nos dias seguintes ele ria como se fosse uma brincadeira. Na escola veio a professora me dizer que ele estava agitado, não queria sentar pra nada mas eu nem soube o que dizer e em casa pelo contrário eu achei ele até bem mais calmo esses dias e claro na hora não assimilei nada com o ouvido. Depois de uns 2 dias ele amanheceu com sintomas de gripe e como eu já tinha uma consulta pra mim resolvi levar o Miguel também, enfim, levei ele por causa dos sintomas de gripe, mas me lembrei do episodio do ouvido e comentei com  a médica que ao examinar já constatou que ele estava com infecção de ouvido mas o Miguel não demostrou em nenhum momento estar com dor. Bom, ele é o meu primeiro filho e nunca teve dor de ouvido e eu sou inexperiente também nesse assunto, mas  talvez se ele falasse, teria reclamo de uma dor que eu até o momento não sabia que ele tinha.
O Miguel nunca demostra quando está com alguma dor, eu sempre uso meu sexto sentido e descubro o que está acontecendo, febre dificilmente deixa ele caidinho, geralmente mesmo doentinho ele está a mil por hora e cada a mim como mãe de um autista não verbal ficar atenta sempre, mas como eu disse, temos sim um sexto sentido de mãe especial que nos faz descobrir coisas que outros nunca veriam, mas nem tudo é perfeito assim, podemos sim falhar, podemos as vezes não conseguir ver ou interpretar o que está acontecendo e nessas falhas meu coração se despedaça e eu fico muito mais muito triste com a situação. Imagine como eu me senti naquele dia na igreja em que eu não consegui descobrir que o meu filho apenas queria água, e agora depois de descobrir que ele deveria estar sentindo dor no ouvido que eu também nunca tive mas dizem que é horrível e eu falhei... 


É assim que eu me sinto, como se tivesse falhado em um dia na minha missão de mãe, sei que somos humanas e portanto não somos perfeitas, mas talvez já nos acostumamos a nos cobrar essa tal perfeição, e essa mania é difícil de tirar, embora muito necessária porque afinal não podemos nos cobrar tanto... Se nada é 100%, e como nosso sexto sentido também é assim. Algumas mães já me disseram que quando o filho sente uma dor ele leva a mão da mãe até o local da dor, ainda não chegamos nisso com o  miguel, ele até faz isso mas se por exemplo acabou de bater o pé em um móvel ele faz isso, mas por exemplo se sente uma dor na barriga ele não vai me mostrar a barriga, eu que tenho que fazer o jogo de adivinhação e ir eliminando as possibilidades e acredito que eu não sou a unica a viver isso e também não sou a unica a se sentir impotente diante do filho que não consegue verbalizar o que sente, algumas vezes no final conseguimos descobrir o porque daquela crise inesperada mas quando não sabemos o que é, a nossa frustração só não é maior do que a própria frustração desses pequenos que não conseguiram nos mostrar o que eles queriam, isso não é uma coisa boa de se viver, mas é realidade. 
Se  até mães de autistas verbais relatam viver coisas assim porque o filho talvez não consiga expressar bem o que queria, imagina nós mães de autistas não verbais que não temos uma palavra para nos dar uma ideia do que pode ser, 
Temos que literalmente adivinhar tudo, do começo ao fim. E é ai que eu respiro fundo, conto até dez, visto a minha dor com um sorriso reconfortante e digo ao meu filho "Está tudo bem, meu amor, a mamãe entende que você quer algo mas ainda não entendi o que é, mas abraça a mamãe e vamos tentar de novo" Nem sempre dá certo, as  vezes ele nem quer o abraço, a frustração é grande demais, mas eu preciso ser forte e mostrar pra ele que eu sempre vou estar aqui, e farei o possível e impossível pra me comunicar com ele, ainda que do nosso jeito, ainda que sem palavras orais, ainda que eu possa falhar na metade das tentativas, mas eu sempre estarei aqui pra descobrir ou pelo menos tentar descobrir, onde está a sua dor...



Conseguimos traduzir os olhares dos nossos filhos, sentimos em nosso coração a pior dor que uma pessoa possa imaginar, é dolorido não compreender o que nossos filhos querem nos dizer., sim, porque traduzimos sim olhares mas tudo seria perfeito demais se sempre fosse assim não é? Mas as vezes não conseguimos saber, porque somos mães sim, mas somos humanos que podemos errar, não somos perfeitas e as vezes não conseguimos entender o que eles precisam no momento.


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